Crit Revolucionária, 2023;3:e007
Artigo original
https://doi.org/10.14295/2764-4979-RC_CR.2023.v3.60
i Universidade Federal de São Paulo, Instituto de Saúde e Sociedade, Curso de Nutrição. Santos, SP, Brasil.
Autor de correspondência: Jesus Faraulo de Oliveira jesus.faraulo@unifesp.br
Recebido: 28 jul 2023
Revisado: 02 ago 2023
Aprovado: 04 ago 2023
https://doi.org/10.14295/2764-4979-RC_CR.v3-60
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O veganismo é considerado como uma filosofia e estilo de vida que abole o uso dos animais nas atividades humanas, e assume ações que podem afetar a realidade material de acordo com sua vertente. O marxismo totaliza em um saber unitário e integrado sua posição crítica acerca da exploração humana feita pelo modo capitalista de produção, e propõe um projeto revolucionário para sua superação. O objetivo é discutir as dimensões políticas do veganismo, e aferir se existem convergências possíveis com as ideias marxistas críticas da forma estado. A análise é feita através de fundamentação teórica crítica e sua comparação com a literatura sobre veganismo. Conclui-se que existe convergência entre marxismo com a vertente vegana anticapitalista, pois a erosão do capitalismo e a emancipação da classe trabalhadora é considerado essencial ao seu projeto de libertação total dos seres sencientes.
Descritores: Capitalismo; Veganismo; Estado; Marxismo; Revolução.
VEGANISMO Y MARXISMO: ¿LIBERACIóN ES REVOLUCIóN?Resumen: El veganismo es considerado una filosofía y estilo de vida que abole el uso de animales en las actividades humanas, y asume acciones que pueden afectar la realidad material según la corriente. El marxismo totaliza en un saber unitario e integrado su posición crítica sobre la explotación humana hecha por el modo capitalista de producción, y propone un proyecto revolucionario para superarlo. El objetivo es discutir las dimensiones políticas del veganismo, y evaluar si existen posibles convergencias con ideas marxistas críticas de la forma estado. El análisis es hecho por una fundamentación teórica crítica y su comparación con la literatura referente al veganismo. La conclusión es que hay convergencia entre marxismo y la vertiente anticapitalista, pues la erosión del capitalismo y la emancipación de la clase trabajadora es considerado fundamental para su proyecto de liberación total de los seres sintientes. Descriptores: Capitalismo; Veganismo; Estado; Marxismo; Revolución. |
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VEGANISM AND MARXISM: LIBERATION IS REVOLUTION?Abstract: Veganism is defined as a philosophy and lifestyle that abolishes the animal use in human activities, and it stands for actions that may affect the material reality according to its stance. Marxism totalizes in an unitary and integrated knowledge its critical stance on the human exploitation made by the capitalist production way, and proposes a revolutionary project to defeat it. The goal is to discuss the political dimensions of veganism, and check if there are any possible convergences with the marxist ideas that are critical of the state form. The analysis is based on a critical theoretical framework and its comparison with veganism literature. The conclusion is that there exists convergence between marxism and the anticapitalist vegan branch, because the erosion of capitalism and emancipation of the working classes is considered essential to its project of total liberation of the sentient beings. Descriptors: Capitalism; Veganism; State; Marxism; Revolution. |
Otermo veganismo, derivado da palavra inglesa vegetarian, surgiu nos anos 1940 pela Vegan Society, que o define como uma filosofia e estilo de vida que busca a exclusão, dentro do possível e praticável, de todas as formas de exploração e crueldade aos animais, e promove o desenvolvimento e uso de alternativas que beneficiem animais, humanos e o meio ambiente. Um dos pontos mais decisivos é a alimentação, marcada pela abolição dos alimentos de origem animal da dieta1. Pelo boicote aos produtos de origem animal, ações em relação aos direitos dos animais, combate ao especismo, e formação de grupos e coletivos, é afirmado um caráter político e inclusive entendimento como movimento social.2-4
O especismo, definido inicialmente por Ryder e Singer,5,6 exclui as outras espécies dos princípios básicos de igualdade aplicáveis à humanidade, por considerá-los de menor relevância já que não são da espécie humana. A partir da visão política do veganismo, são detectadas tendências distintas para o fim da exploração animal. Parte é convictamente anticapitalista e revolucionária, que entende-se enquanto um projeto de libertação de seres para além dos animais. Outra é liberal e reformista, pois negocia com os interesses de mercado e grandes corporações, além da tendência em ver o veganismo como uma escolha pessoal e um estilo de vida, sem agregar outras lutas.3
O paralelo delas com a obra marxiana e marxista é inevitável, uma vez que todas perpassam o sistema de produção capitalista. Assim, é louvável uma reflexão do veganismo pelos referenciais da Teoria Política Crítica, seja na aproximação com a tendência anticapitalista, em suas convergências e divergências, seja na denúncia dos mecanismos de manutenção do capital em sua relação com a corrente liberal.
O ensaio busca contextualizar definições e constatações sobre a política, na perspectiva de um referencial teórico crítico e derivacionista, e como pesquisadores ligados ao veganismo interpretam a ação política em prol da libertação animal, e também os consensos e dissensos entre as diferentes concepções do veganismo em sua relação com o capital. Ademais, como a crítica marxista pode contribuir para o debate vegano, e se existe nexo anticapitalista entre as mencionadas ideias.
Para abordar política sob uma perspectiva marxista, é sobretudo necessário situar seu papel dentro de tal pensamento. Codato,7 cientista político da Universidade Federal do Paraná – UFPR, analisa o espaço político baseado nos escritos marxianos pós-1848, diagnostica a concepção do espaço político como uma forma. Logo, a forma política funciona no espaço político-social tal qual a forma-mercadoria desempenha no espaço econômico-social, como uma ilusão real. Ambas criações do fetichismo, o feitiço que esconde as relações materiais dos processos de produção na epítome do que é uma forma: a aparência. No fetichismo político, a aparência são as forças políticas em seus agentes - partidos, indivíduos, facções parlamentares, grupos de interesses, publicações - em detrimento da essência, correspondida pela constatação basilar do materialismo histórico: a luta de classes.
A própria enunciação do vocábulo política, e a consequente invocação semântica de um campo envolvido mas ainda assim setorizado das outras relações sociais, é advinda de uma episteme positivista – viés que alicerça o estado capitalista de direito da modernidade ocidental. Seja no neoconservador Samuel Huntington, ou no Socialista Liberal Norberto Bobbio, a compartimentalização da política dos outros campos das relações sociais de relação e poder é uma noção tão constitutiva que termina por denunciar-se na própria asserção de que a teoria política em Marx seja inexistente. Borón,8 cientista político argentino especializado em estudos latino-americanos, diante disso, dobra a aposta: de fato não há, nem seria possível.
Segundo ele, a teorização da política, feita pelas ciências sociais e políticas convencionais enquanto uma parte, um sistema ou uma ordem de um todo, por fim termina em uma incompletude confusa de saberes que configuram uma crise terminal das ciências sociais. Contrário ao mencionado isolamento, para o autor sul-americano a política só existe se articulada com a economia e sociedade, sem a possibilidade da existência de nenhuma delas enquanto realidades autônomas e independentes, mas englobadas em um campo de reflexão único. Pensá-las, e então defini-las em separado é um exercício de abstração vazio face à realidade material das coisas. Tal integração é reconhecida por Holloway,9 no debate de derivação do estado. Para o sociólogo irlandês, o Estado não é uma superestrutura a ganhar sentido por sua base econômica, todavia “uma forma historicamente específica das relações sociais”:9
A existência do estado como uma instância separada é, portanto, dependente da relação de capital e sua reprodução é dependente da reprodução do capital. Nesta perspectiva, a existência política e economia (pois é somente sua separação que constitui suas existências como esferas distintas) não é nada mais que uma expressão da forma histórica particular de exploração (a mediação da exploração por meio da troca de mercadorias). A Política economia são, portanto, momentos separados da relação de capital.9(1468)
Economia e política são particularizadas como formas distintas no estado capitalista, e a fragmentação do capital é a centralidade do fetichismo de mercadoria. O servo feudal transformou-se no moderno assalariado por meio do feitiço da transformação de sua força de trabalho em mercadoria. Assim, categorias separadas mas necessariamente interligadas, modificadas pelo verniz de igualdade formal sobre sua desigualdade material. Esta fetichização particulariza as relações sociais de modo a anular a organização de classe, já que nubla sua experiência. Trata-se do processo, e por isso forma-processo, compreendida em última instância como o próprio estado, que garante a reprodução do capital A análise das formas deve ser histórica - história definida classicamente por Marx9 pelo movimento da luta de classes.
A definição supracitada é primordial, pois também é debatida em Casillas,10 pesquisador mexicano da Universidade Iberoamericana, que amplia história para uma série de conjunturas que são o momento de inserção de práticas e projetos de diferentes sujeitos. Conceitua o político por história real, cuja primazia é o nexo com o sujeito, este último destacado em Marx enquanto o proletariado, e revisto pelo mexicano como aqueles que geram os projetos e estratégias de intervenção na realidade.
Após o aparecimento do termo vegan no Reino Unido quarentista, passou-se a definir toda prática condizente com a definição, anterior ou posterior cronologicamente, enquanto veganismo.11 Contudo, em razão de diferenças de motivação e concepção da prática, alguns indivíduos rejeitam o termo para autodefinição, e utilizam por exemplo abolicionismo animal, pois o termo veganismo para esses está associado a pautas contrarrevolucionárias. Por conseguinte, aqui é definido que o termo veganismo será aplicado para designar todo posicionamento que rejeita a exploração animal, em seu sentido amplo; coerente com o afirmado por Dickstein e colaboradores: “o termo é menos importante que a práxis que tanto o antecede quanto vai segui-lo”.12(10) Mas o simples conhecimento da referida cisma já demonstra a complexidade da discussão. Destarte é necessário apontar diferenças decisivas dentro do veganismo, e conceituar as duas principais correntes: o Veganismo Popular (também chamado de Interseccional, Abolicionista, Revolucionário), e o Veganismo Liberal (também chamado de Estratégico), doravante abreviados por VP e VL.
A primeira vertente “reconhece os inquebráveis elos entre o modo de vida vegano, a luta pelos direitos dos animais não humanos e as lutas pela libertação dos seres humanos, em especial das minorias políticas”.3(78) Critica o mercado e seus dispositivos, preocupa-se com a exploração dos trabalhadores da indústria animal e a mais valia, e também com a interseccionalidade, concebida como a forma que os sistemas discriminatórios criam desigualdades básicas em diferentes sujeitos pela raça, classe, gênero e outros. No Brasil, a dificuldade de acesso aos serviços públicos e vulnerabilidade social de determinadas geografias ajudam a reforçar o caráter de classe dessa postura, em que muitos de seus sujeitos declaram sua condição de moradores de periferia, também ao lançar mão do título de veganismo periférico.
A segunda corrente advoga o gradualismo para conquistar a libertação animal, e considera o VP radical e sem efeito de curto prazo. Apesar de priorizar empresas veganas, aceitam empresas não veganas dispostas a produzir itens veganos ou, em uma definição estrita, plant based. Logo, estão abertos a negociar produção com o mercado e medidas paliativas com o estado de direito, e compreendem tal posição por pragmática.
É importante salientar que a demografia do veganismo, nacional e internacionalmente concentrada em um perfil feminino, branco, jovem e com ensino superior,13 não é condicionante para a adoção de uma corrente ou outra, da mesma forma que não deve ser feita a correspondência entre partido político com classe social,7 e em suma, que as categorias demográficas acima citadas dentro da lógica do capital no estado democrático de direito é considerada por Holloway9 enquanto grupo de interesse, já que não considera a classe dos indivíduos.
Na obra marxiana, apontamentos concernentes aos animais são encontrados, sempre em contraponto à condição de trabalho, produção e exploração do trabalho humano. Um estudo importante sobre Marx e a exploração animal foi perpetrado pela economista australiana Eliza Littleton.14 A pesquisadora atua em estudos de economia política e libertação animal, e destaca a atual organização do sistema de pecuária industrial, usado predominantemente por países ocidentais, já em adoção pelo leste asiático, enquanto há um abandono quase absoluto da pecuária pastoral nos países periféricos. Com advento desse tipo de produção, propagam-se a concentração de mercado e a centralização de seus players, em um processo de predação de empresas menores em busca do aumento de sua economia de escala, redução de competição e crescimento de margens de lucro. O próprio sistema tem sua gênese motivada pelo desejo de aumentar a produção de comida - de origem animal – com o uso de mais capital, menos trabalho humano e mais rendimento de produção.
Alterações possíveis graças ao ganho de eficiência por meio da tecnologia, em busca de produzir com mais rapidez e menos custos e uso de trabalho humano. Isto é, aumento da mais valia relativa, ligado com a descoberta científica e inovação tecnológica. Apesar das vantagens, segundo Martins,15 sociólogo e colunista da Boitempo Editorial, Marx na Teoria da Revolução Técnico Científica declara a ciência como força produtiva revolucionária e pós-capitalista. Consequentemente, nunca é totalmente absorvida pelo capital, cujo legado perdura por gerações e semeia contradições que forçam seu sistema a adaptar-se. Na perspectiva neo-braudelina de Wallerstein e Arrighi, as mudanças promovidas pela ciência e tecnologia debilitam estruturalmente o capitalismo histórico, sistema baseado na busca incessante por acumulação ilimitada.
A inovação tecnológica pode ser vista no uso da reprodução seletiva e hormônios de crescimento, que à parte do interesse no aumento da produção, busca controlar a qualidade dos alimentos, e deixar os animais resistentes a doenças.14 As consequências para os interesses coletivos por sua vez, como lembrado por Wallace, biólogo evolucionista estadunidense, manifestam-se no aumento de epidemias globais oriundas da supercriação de animais confinados.16 Cuja saída tem sido aventada pela aposta do capital na carne de laboratório, que promete sustentabilidade ambiental, mas cujo processo extremamente complexo e custoso inviabiliza ainda mais a possibilidade de participação de produtores menores em detrimento de corporações que podem custear a criação e manutenção de laboratórios de produção tão sofisticados.17
A maneira na qual a indústria da carne é estruturada, talvez seja uma das mais representativas atualmente do modelo inglês oitocentista analisado por Marx em seu Capital. A divisão de trabalho e velocidade das linhas de produção, culmina na realização de abate, evisceramento, corte e empacotamento de um bovino em um lapso temporal de 15 minutos. A indústria é de margem de lucro baixa.14 o que significa que a fome pela mais valia mastiga o esforço dos trabalhadores e literalmente a vida dos animais. Na língua inglesa, a palavra livestock, usada para designar os animais de trabalho e produção de bens, em sua análise linguística de etimologia não poderia ser mais fiel ao seu uso: estoque de vida.
Vida difícil de ser inteligida pelos consumidores em razão da homogeneização de boa parte das partes físicas em itens cárneos embalados, que por sua vez, demonstra dois outros conceitos marxianos quiçá de forma ainda mais literal. A existência do animal outrora íntegro, após uma longa cadeia de processos de produção deixa de ser reconhecível pelos consumidores no mercado, distanciados que estão da integralidade do sistema produtivo, e convencidos que estão pela sua embalagem e etiqueta de produto. Consumidores cativos da alienação, que disfarça a vida, e da fetichização, que oculta a morte.
Ainda sobre o processo de transformação de animais em coisas, ele corresponde ao processo de degradação e fragmentação descrito por Marx, que atinge o nível de peça de maquinário. Littleton aproxima a preocupação e descrições marxianas sobre o tratamento da classe trabalhadora pela produção capitalista de mercadorias, com aquilo que acontece com os próprios animais, que transformam-se nelas. O claustro do confinamento intensificou sua dependência por alimentação e cuidado humano, e pode ser comparada à liberdade dúbia e ilusória dos trabalhadores em ter a chance de vender sua força de trabalho para conseguir sobreviver. Enquanto vivos, os próprios animais sofrem alienação do que produzem (ovos, leite, mel e até a prole), de seu ecossistema, e a negação de elementos importantes de sua vida natural – fora de fazendas e confinamento. A autora reconhece que, embora não seja a mesma, a alienação sofrida pelos animais é similar à alienação humana de sua condição natural, decorrente da exploração de seu trabalho e vida pelo sistema capitalista.
Apesar das similitudes, não são correspondências, pois é necessário ressaltar que em Marx definições como trabalho e exploração são específicas, e remetem diretamente ao modo de produção de mercadorias. O pensamento de esquerda tradicional, incluso o marxiano, atribui aos animais objetividade e não subjetividade, e incapacidade de ação própria.12 Logo, a definição de trabalho é constituída por sua possibilidade de oferta como mercadoria, o que não é aplicável aos animais, que consequentemente não sofrem exploração, pois não vendem sua força de trabalho.
Para Marx os animais constituem um capital fixo junto de fatores inanimados de produção, e cujo valor é dado pelo trabalho humano empreendido para sua produção. Nem sua hierarquização enquanto seres passíveis de uso como mercadoria, por mais que tenha paralelos com a divisão de classes e exploração de uma pela outra, pode ser correspondida por um tipo de classe. A última consiste em uma concepção especista, por ser legada por Marx exclusivamente aos humanos, em razão da cognição homogênea e capacidade de organização revolucionária da espécie, limitada nos animais.14 Revolução na concepção marxista tradicional implica em organização hierárquica (lideranças e militâncias), filiação, uma agenda política e um sistema de comunicação complexa.18
Autores posteriores, contudo, colocam a necessidade de reexaminar tais questões, ao confrontar o modelo do trabalhador masculino assalariado, que não só serviu de corpus para as análises marxianas em seu tempo, como protagoniza seu projeto de resistência e revolução,14 coerente com o proposto por Casillas,10 que considera a necessidade de repensar a clássica centralidade do proletariado como o sujeito histórico único, para ampliar enquanto sujeito quem tem possibilidade de um projeto.10
Para Marx, as atividades definem a espécie. Os animais produzem para propósitos imediatos, por inecessidades. Já a produção humana é universal, guiada pela própria vontade. Os animais não distinguem suas atividades de si mesmos, as duas coisas estão em simbiose. Assim, enquanto a produção animal é por instinto, a humana é por imaginação, e por isso caracteriza trabalho. Littleton argumenta que a distinção de Marx entre humanos e animais não é forte o bastante para negar a essência da vida animal quando suas possibilidades de subsistência são privatizadas e subsumidas pelo modo capitalista de produção de mercadorias.14
O autor alemão, viveu e morreu no século retrasado, então não é admirável que suas asserções acerca da consciência e comportamento animal seja disputada e inclusive refutada por evidências científicas e filosóficas acumuladas em mais de um século após seus escritos, em que o excepcionalismo humano deixa de ser uma certeza.12,14 A proposta é que a ideia de exploração, ainda que não seja de acordo com o conceito marxiano original, seja passível de ser mantida em uma perspectiva marxista com relação aos animais caso não haja uma ruptura com a materialidade das questões de classe. Andréia Galvão, socióloga e pesquisadora do Centro de Pesquisas Marxistas – Cemarx, do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas – IFCH, da Universidade Estadual de Campinas – Unicamp, ao analisar movimentos sociais, em relação àqueles que demonstram interseccionalidade de pautas, afirma que as lutas não se excluem; na América Latina a partir da década de 1990, os movimentos que eclodiram e sobreviveram são provenientes da classe trabalhadora, que mesmo heterogêneos são unidos pela ideologia antineoliberal.19 Eles são frutos do aparecimento de contradições não situadas necessariamente no nível das relações de produção. Destarte, a opressão não vem em função da exploração no sentido marxiano, mas da posse de determinado poder derivado da organização social, concomitantemente capitalista, racista, sexista e patriarcal. Entretanto, embora nem todo conflito possa ser relegado ao embate de classe, também não pode ser desconsiderado o eixo de conflito entre capital/trabalho. Ainda, os movimentos não devem ser entendidos como reação, formas de dominação e opressão, mas em relação à exploração realizada pelo capital. Segundo a autora, pesquisas de inspiração marxista sobre essas intersecções as articulam com a situação objetiva de classe, como acontece também com a literatura sobre o veganismo, mais especificamente o VP, inclusive com evidências empíricas do Brasil, México e Itália.18,20,21
Ademais, verifica-se o diálogo direto com o VP, uma vez que sua pauta é pela libertação de todos os seres, e a questão animal destaca-se exatamente pelas espécies não-humanas estarem em absoluto coisificação. Tanto que, na crítica marxiana, a exasperação contida diante da situação do proletário inglês daquele momento histórico residia em sua condição semi-coisificada, um quem (uma pessoa), tratado como um o que (uma coisa, mas na língua inglesa, também um animal). Os animais, no processo capitalista de produção de mercadorias, são carne cativa, e primam por seu valor de morte, que não corresponde a nenhum trabalho humano.12
Alguns autores propõe a discussão se os animais não entram em conceitos marxianos pré-capitalistas, como a escravidão. Julga-se sua menção válida, todavia foge do escopo do ensaio endereçá-la. Aqui o esforço, ao invés, é de menor preocupação com encaixe em categorias e definições clássicas, e enseja verificar a possibilidade de convergência com seu projeto anticapitalista. Assim, faz-se necessária a análise de tais potencialidades nas vertentes veganas, cristalizada em uma crítica ao VL e no exame das possibilidades do VP.
Dickstein e colaboradores,12 um grupo de pesquisadores norte-americanos ligado ao estudo de ciências humanas, elaboram uma definição específica do veganismo como um boicote, enquanto uma tática em um horizonte político mais amplo de libertação total, que oferece uma forma efetiva de erodir o capitalismo e outros sistemas de dominação. O grupo considera a definição flexível o suficiente para adaptar-se a muitas circunstâncias materiais e culturais.
Apesar do VL também existir no imaginário e entendimento popular, consideram que o veganismo refere-se exclusivamente a um padrão de ação praticado por indivíduos e grupos, sem preocupação de aperfeiçoamento individual do sujeito em um campo existencial ou filosófico, como indivíduos ligados ao VL professam, mas o confronto e rejeição em participar de sistemas de exploração.12
Evidências empíricas do Brasil, especificamente de estudos com veganos potiguares, paraibanos e pernambucanos,2,21 atestam a ideia de que o boicote vegano só faz sentido quando aliado não só às lutas de gênero e raça, mas principalmente contra o capitalismo, em associação com o anarquismo, comum em muitos indivíduos e coletivos veganos. No mesmo corpus.21 é destacável a ocorrência das duas correntes, quando os participantes descrevem o veganismo com suas palavras: estilo de vida, filosofia de vida, posicionamento ético e político, os dois primeiros termos ligados ao VL e o último ao VP.
Apesar da tendência de que veganos associem-se entre convergentes, como de fato acontecem em coletivos (organização por excelência do VP) e institutos e ONGs (mais comuns no VL), é comum a existências de veganos não necessariamente definidos ou conscientes das distintas correntes, cujas ideias acabam por ser vislumbradas em discussão dentro de questões de mercado, como consumir produtos vegetais advindos de grandes corporações não-veganas, comida de restaurantes não-veganos mas que oferecem opções compatíveis, perceptível na amostra do estudo nacional.
As grandes empresas, diante dos veganos, percebem a oportunidade de um novo mercado. Uma operação neutralizante do capitalismo através de concessões que não impactam a ordem social.20 Trata-se do movimento de adaptação do capital perante possíveis ameaças, por meio de suas formas.
Em conexão com o percurso conceitual traçado nas passagens anteriores de Holloway,9 o autor afirma que as formas não são categorias abstratas, pois sempre tomam corpo a partir de relações de produção materiais – ou seja, por meio da fetichização. Logo, as formas fetichizadas que o capital aparece são formas de dominação de classe, e são inevitavelmente instáveis.
Obviamente, pois o antagonismo gerado pela exploração não pode gerar estabilidade. O autor argumenta que a condição normal das coisas é a instabilidade, e para isso exemplifica as relações em famílias, escolas e fábricas, palcos de violência e conflitos ao longo da história, longe do paraíso vendido pela ideologia burguesa. Tais relações nunca são pré-dadas, pois o capital é inerentemente dinâmico, sua sede insaciável por mais valia o leva o tempo todo a intensificar a exploração e reformular as relações entre capital e trabalho.
Desta feita, as formas-processos são sempre cambiantes e ao mesmo tempo fragmentadas, em um movimento histórico interconectado formulado pelas próprias contradições do capital.9 que para não ser mordido precisa engolir uma demanda que transcende a preocupação pelo lucro da sociedade burguesa, e colocar corporações mundiais de produção massiva de alimentos cárneos e produtos de origem animal para produzir comida plant-based e itens livre de testes com animais, definido por veganwashing.20
O VL ao aceitar seus produtos e serviços, produzidas de forma setorizada para corresponder com suas demandas anti-exploração animal, pode justificá-lo como pragmatismo, ou como sua outra definição atesta, enquanto estratégia, pois não vê uma saída estrutural no horizonte ou considera sua própria possibilidade utópica. Contudo, contribui para a manutenção das práticas especistas e burguesas, que para os veganos anticapitalistas estão imbricadas.
A setorização aceita pelos veganos liberais reflete o processo de atomização dos indivíduos em particulares pela forma estado no capitalismo para Holloway.9 Em sua perspectiva, o estado constitui-se em forma estado, instituição aparentemente autônoma derivada do capitalismo em seu aspecto de fetichismo de mercadoria. A constituição do estado é um processo de fetichização, de fragmentação das relações de classes em formas não classistas, cuja atividade social reproduz a classe em indivíduos atomizados impossibilitados de organizarem-se contra o capital.
O estado isola as pessoas tratando-as como indivíduos, mas não indivíduos concretos e peculiares, mas indivíduos gerais e abstratos, isto é, desindividualizados. Transfere-se aqui a abstração da produção de mercadorias para uma cidadania abstrata. Os indivíduos são tratados por uma relação geral, sem distinção pelas peculiaridades, muito menos por sua classe. Essa individualização do capitalismo é distinta da individualização prismada em direitos civis, políticos e sociais, que são conquistas da classe trabalhadora; ao contrário, é uma condição de indivíduo regida por uma relação geral, um montante de sujeitos abstratos que gesta um coletivo esvaziado.
Nesse aspecto, o coletivismo não é o oposto do individualismo, ele o completa com base na individualização e abstração, por um rearranjo de indivíduos atomizados em classes por critérios que obscurecem o conceito de classe. Esse agrupamento e reagrupamento é dado por características diversas, por exemplo emprego, hábitos, nacionalidades, direitos políticos e econômicos, eis os grupos de interesse, mas nunca a classe.
Logo, a grande indústria encapsula o potencial de confronto ao sistema de produção capitalista do veganismo ao atomizar seus sujeitos, transformados em grupo de interesse para sua produção setorizada. O VL aceita e fomenta essa lógica, ao mesmo tempo que reifica a partir de sua fidelidade ao estado de direito de igualdade formal da forma jurídica e do conceito de direitos subjetivos, seu desengajamento da luta pela modificação da desigualdade material.
A forma jurídica, segundo Mascaro, jurista marxista da Universidade de São Paulo, é garantida pela predominância do juspositivismo, nada mais que a oficialização do direito positivo e das instituições políticas e jurídicas liberais,22 é por sua vez outra derivação da forma mercadoria, porém enquanto garantia das obrigações entre agentes transacionadores ao transformá-los em sujeitos de direito, que aí podem ser submetidos às regras do capital, como a propriedade privada.23
A crítica da corrente anticapitalista sobre o VL busca inclusive reparar o que as primeiras organizações contemporâneas demonstraram de falta, perante sua ótica. A fundação da Vegan Society foi investigada por Davidson,11 desde o contexto de seu surgimento em plena Segunda Guerra Mundial até sua relação com o estado britânico.11 Na atualidade, a autora (professora do Núcleo de Bioética e Ética Aplicada da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ) percebe uma falta de abertura para o diálogo e reconhecimento das realidades do Sul Global, na desconsideração de suas possibilidades próprias e locais de veganismo. Assim, o veganismo da fundação é caracterizado pela inacessibilidade, eurocentrismo e exclusão.
A Instituição nasceu enquanto o estado britânico fazia campanha pela produção doméstica de alimentos, principalmente hortas concentradas no trabalho feminino, em um esforço de garantir subsistência alimentar em meio ao conflito bélico na Europa. A Vegan Society, nos artigos de sua revista da época, apoiava as medidas de governo, silenciosa acerca de questões colonialistas e classistas do Império Britânico, e fazia coro ao reforço de papeis de gênero dado pela campanha hortícola, seja ao imprimir sua propaganda, seja pelo conteúdo em si de autoria feminina na publicação, reduzida em relação aos homens. Sua conclusão é que esse veganismo ao nascer não se propôs a subverter relações de poder, e serviu na prática como ferramenta política para manutenção de poderes econômicos e reedição de hierarquias.
A Vegan Society é a instituição mais representativa dos interesses da corrente liberal e sua maior identificação, em conjunto com outras grandes organizações (People for the Ethical Treatment of Animals – PETA, Mercy for Animals, Animal Equality).3 assim tem grande peso para legitimação do que é veganismo na visão do VL exatamente por ser quem cunhou o termo e por sua tradição e longevidade, além do apreço à sua organização jurídica estabelecida.
Contudo, Davidson11 disputa o status de autoridade da organização em definir o que é veganismo, ao notar a existência de práticas de boicote bem anteriores ao seu surgimento e inclusive fora do ocidente,11,12 e ao conceituar que enquanto projeto de libertação de seres, o veganismo deve ser capaz de retirar de suas pautas elitismo e etnocentrismo, através do reconhecimento dos veganismos - como chama as encarnações do veganismo que abarcam as questões locais, de países periféricos e suas próprias periferias, de raça, gênero e outras interseccionalidades.
Os veganismos ao apresentarem respostas anti-opressivas, são fiéis ao objetivo de libertação total, de importância e forte simbolismo para a causa, ao integrarem-se politicamente com outras lutas. Pois, como considerado pela abordagem de Dickstein e grupo,12 o veganismo é “intrinsecamente uma forma de práxis: uma recusa em participar de exploração como parte de uma convicção política e estratégia de mudança política”.12(10)
Curiosamente, de acordo com Davidson, a própria publicação da Vegan Society, foi palco de disputas sobre o direcionamento, em que Donald Watson,11 menos afeito ao especismo e mais preocupado em sua exclusão da alimentação humana, era contrastado com Leslie Cross, interessado em levar os direitos dos animais à nível constitucional e visto como radical. A influência e carisma do primeiro parece ter sido decisiva para sua hegemonia, e também para o afastamento do segundo da organização.11
Por conseguinte, é patente a tendência reformista da corrente liberal, que suprime as possibilidades materiais de emancipação justificadas pela necessidade de manutenção da forma jurídica. A questão de classe deve ser ressaltada, pois quando Souza3 pesquisou a comunicação de entidades nacionais ligadas ao VL, como a Sociedade Vegetariana Brasileira, constatou sua tendência em fazer divulgação nos locais frequentados por grupos de maior poder aquisitivo, como bairros nobres, e também no perfil dos modelos escolhidos para suas peças publicitárias.3
A forma jurídica, mais um dos artifícios fetichizados das relações do capital, aqui camufla o desejo de manutenção de propriedade privada e mais valia, pois não é diferente da forma mercadoria, que possibilita a reificação das relações econômicas capitalistas (como a produção e a troca), e simultaneamente mistifica e oculta sua essência social – ou seja, a exploração.7
Os veganos periféricos, diante de restaurantes caros e produtos oriundos de complexos processos tecnológicos da ciência dos alimentos (os alimentos do futuro), protestam diante desse veganismo irreal de mercado, insistem na factibilidade de uma dieta composta de alimentos acessíveis em feiras livres e sacolões populares, e dentro da cultura alimentar periférica,2 ou seja, de uma parte predominante da classe trabalhadora.
A crítica da corrente popular compara a tendência liberal a um ascetismo religioso, onde a ética reside apenas no corpo e ego do indivíduo, e que dirige-se a uma ética de cuidado neoliberal consumista.12 Tal ética está na sociedade desindividualizada de direito criada pelo sistema capitalista, fruto do processo de fetichização universal que caracteriza a sociedade burguesa em sua ideia de estado ético, representante do interesse universal da sociedade, como pontuado por Borón.8
Essa pretensão desconsidera a materialidade, e por consequência, não contribui para o caráter de fato emancipatório do veganismo por isolar-se do todo, ou seja, da luta de classes e suas contradições. A contribuição do marxismo, consiste em um saber unitário e integrado, que como discutido anteriormente, rejeita as divisões liberais. Assim, o veganismo pela lente liberal de fato desencontra os preceitos marxistas e não há sintonia.
Já a corrente popular encontra no reconhecimento de assumir a luta de classes como alicerce para sua ideia de libertação total, convergência com o marxismo; e advoga que a libertação de todos os seres sencientes deveria ser o objetivo não só dos marxistas, mas de toda a esquerda.12
A questão do político, discutida anteriormente, sobrevive em algumas críticas feitas ao veganismo, que recebe acusações de não sê-lo. É feita a ressalva que dessas linhas em diante o termo veganismo vai abarcar somente a vertente popular, pois é a única dotada de potencial para dialogar com a discussão; a vertente liberal será referida de forma específica.
Em uma perspectiva clássica, que remete aos estudos marxianos, a política aparece como um elemento de aparências e fetichização dos interesses de classe ligados a partidos, e como algo que tomará outro significado após a revolução.7,8 Pelo pensamento materialista, mais importante do que a política enquanto vocábulo, é sua conexão com o potencial revolucionário.
Casillas10 recorda que classicamente o marxismo localiza a política em um lugar definido, o estado, e o partido político é o condutor para a tomada de poder. Tal concepção não é cabível atualmente, e o autor propõe caminhos para a refundamentação da teoria marxista nos níveis metodológico, epistemológico, político e teórico.10
Destarte, aborda o sujeito – que na visão tradicional trata-se do proletariado – no conceito de protagonista de uma história pré-determinada. Postula que haja uma reconstrução do conceito de sujeito na teoria social marxista, pois não se pode mais sustentar que seja o proletariado o agente histórico de mudança. Nesse ponto de partida, repensa-se a história e os sujeitos em processo de construção, por meio de um caráter de certa forma descentralizado.
Em consequência, condiciona uma ampliação da ideia de política também, reimaginada para além do exercício de poder, no escopo das relações que permeiam todo o tecido social – ou seja, as relações de poder. Ao ampliar o conceito de política, há o resgate de relações sociais extirpadas quando se operava com um conceito de política restrito.
O veganismo faz parte dessas possibilidades na medida em que ataca o ponto central ao qual o estado capitalista foi estruturado – a produção de mercadorias, através do consumo, o não-consumo do boicote. Retoma-se a contribuição de Dickstein e colaboradores,12 que situa o veganismo como uma tática de boicote focado principalmente em comportamentos de consumo individuais e coletivos que afetam os mercados, do tipo que a esquerda suportou desde sempre no contexto de um amplo escopo de esforços de justiça social.12
Para melhor compreensão, é válido mencionar dados empíricos coletados por Vilela21 no nordeste brasileiro, que ao investigar a dimensão e entendimento políticos de veganos, detectou o boicote como a ação mais frequentemente relatada, dada sua importância no meio por ser compreendido como uma ação política engajada.
Alguns indivíduos declararam que agem menos nas ruas e mais nas cozinhas, a partir da produção própria de preparações veganas e sua oferta para as pessoas em geral. Classificado pelo autor por “ativismo gastronômico”, que imprinta na cozinha e alimentação um papel político, e ao evocar Portilho21 (cientista social da UFRJ ligada ao Grupo de Estudos do Consumo) destaca o enunciado de que a emergência da politização do cotidiano por meio da reavaliação dos hábitos de consumo associa-se a um movimento que amplia aquilo que vem a ser a própria noção de política.
Acerca do potencial de disruptura do consumo, tornar-se vegano não vai imediatamente virar o jogo do capitalismo, porém atinge pontos importantes de reflexão: o capital não vai desintegrar da noite para o dia sem mudanças de mercado e consumo anteriores à sua queda. Tal derrocada é possibilitada pelo impacto de mercado da destruição da demanda de produtos de origem animal e o processo de obsolescência de sua produção, e pela reimaginação de relações multi-especistas não baseadas em dominação mediada pelo consumo.12
É importante não reduzir o conceito de consumo ao entendimento único de compra, mas a inserção dentro de uma rede de relações a partir de uma perspectiva específica, no caso do veganismo a criação de um ecossistema que prima por ideias centrais de libertação dos seres sencientes, e que organiza-se de forma autônoma em feiras, coletivos, e cooperativas de agricultura orgânica.21
É possível encontrar o veganismo na literatura científica denominado por movimento social,11,20,21 porém o debate acerca da acurácia do termo na perspectiva marxista não compreende o escopo do presente ensaio. Todavia, independente de sua classificação, muitos elementos dos movimentos sociais encaixam-se na discussão, como os aportes de Galvão em sua investigação sobre sua relação com o marxismo,19 e também da posição crítica de alguns autores em afirmações que muitos movimentos sociais foram ignorados pelo marxismo, em desafio às metodologias de classe por propor uma reconstrução do conceito de exploração para considerar categorias como casta, gênero e etnia.14
Em retorno ao consumo, faz sentido a controvérsia sobre sua natureza, uma vez que o trabalho por um salário, e seu uso pelos trabalhadores, que é o consumo, é uma promessa burguesa de liberdade, aqui fetichizada. Entretanto, também pode ser depreendido que a crítica da esquerda é fruto da internalização de uma premissa liberal que resguarda o consumo como campo de individualidade fora da moral e política,12 no entendimento vigente que fragmenta e desindividualiza.
Lopez18 (pesquisador ligado ao departamento de Artes e Humanidades da Universidade das Américas – FAM) analisa ao que define de movimento vegano em Puebla-México, e reflete acerca da revolução vegana, em holofote na mídia de massa enquanto a nova consciência ecológica mundial, associada mais a um estilo de vida do que ações revolucionárias tradicionais. Em um senso marxista, segundo o autor não é possível falar de revolução vegana, já que carece de objetivos e ações direcionadas a mobilizar um levante social, o que inclui a possibilidade do uso de violência, contra um regime imperialista ou estatal.
A solução encontrada para o entendimento do veganismo é colocá-lo em uma perspectiva pós-hegemônica, em que o povo, ou o proletariado, são substituídos pela multidão. A crítica prossegue que o movimento vegano, por seu relativo pequeno número de indivíduos, estratégias não violentas, e posicionamento político não governamental está alheio às singularidades da revolução. A revolução significa tradição ideológica, como o comunismo e outras tradições teóricas, e não pode ser definida baseada em comportamentos e estilo de vida.
A mudança para uma dieta vegana não altera o sistema econômico, só troca um elemento por outro e não altera o modo de produção capitalista, além de não abandonar o paradigma da modernidade. A multidão de veganos, para Lopez, não tem um projeto definido de sociedade. É uma visão reducionista do veganismo, que não leva em consideração as próprias propostas internas de reestruturação do pensamento marxista, como vista em Holloway9 e Galvão,19 mas principalmente em Casillas,10 além de reconhecer o veganismo somente em sua encarnação liberal, que de fato mantém intocada a estrutura vigente.
O veganismo, como já abordado anteriormente, descreve um projeto definido de libertação total, até mesmo em indivíduos não necessariamente declarados anticapitalistas, e um projeto com ainda maior definição naqueles abertamente anticapitalistas, como observado em amostras brasileiras.21 O conceito de multidão, por sua vez, dialoga com a desindividualização e fragmentação do indivíduo empreendida pelo estado,9 em um esforço exatamente de transformar o veganismo em um grupo de interesse atomizado, que oculta a conexão da libertação de todos os seres sencientes com a libertação da classe trabalhadora.
Logo, a multidão individualizada é uma das dificuldades de organização. Como indicado pelo grupo de Dickstein,12 apesar dos efeitos tangíveis que boicotes propiciam, o veganismo consiste de decisões de consumo de indivíduos desagregados e não coordenados, que é a contradição de uma ação coletiva: enquanto sua adesão universal proporciona muitos benefícios, o efeito imediato é baixo se a ação é isolada.
Os autores reconhecem que mesmo a existência de organizações em grupos e até instituições, ainda aparece majoritariamente disperso e quase totalmente como uma prática individual de consumo. O que o coloca diante da crítica mais forte: da ineficiência de seus efeitos e o foco em soluções individuais, apolíticas e de consumo para questões estruturais complexas.
Uma das críticas contra o consumo político do veganismo trata-se de que é de fato irrelevante se não atinge mudança estrutural, e acusam uma ligação com o neoliberalismo, em sua recompensa de realização pessoal que desestimula a vontade de mudança social, o que infere que tal entendimento do fenômeno limitado somente ao VL,3 que nas palavras de Bertuzzi,20 foi das ruas para as lojas.
Na verdade, trata-se de uma armadilha, pois isso é nada mais que a internalização das tão criticadas categorias neoliberais,12 pois as evoca ao recortar os indivíduos em grupos de interesse9 e dicotomias: cidadão-consumidor, consumo-ação política, coletivo-individual, além de alegar a exclusão mútua de ação individual e ação coletiva.12
Em contrapartida, nada impede que o veganismo possa ser articulado, mas não requer aderência política e ideológica necessária com nenhuma agenda específica de libertação animal; não obstante, Dickstein e colabores12 veem uma a convergência revolucionária ao considerar que os objetivos da esquerda consistem no confronto às indústrias e processos de produção, cujas bases por sua vez estão na mercantilização e na violência dos animais.
Esta concepção é inspirada na descrição de Steven Lukes,12 sociólogo britânico, que vê a esquerda como uma tradição e projeto que embate os princípios sagrados da ordem social, desigualdades injustificáveis mas remediáveis, através de ação política, conjunta de um comprometimento crescente com a justiça ambiental.12 É notável o quanto o especismo estruturou o capitalismo, desde o início de sua mudança do feudalismo para a consolidação dos estados europeus que para Wallerstein e Arrighi,15 é a incepção do sistema-mundo.
A fundação deles na Europa demandou uma organização aparelhada por redes dependentes de transporte animal e criação de grandes rebanhos, para instalação de suas seções administrativas, comunicação e alimentação de suas forças militares. Da mesma maneira, os animais eram a centralidade da produção nas colônias da América do Norte, e por consequência fundamentais para a origem dos Estados Unidos da América.12
Entendida dessa forma, a libertação total promovida pelo veganismo ao atacar o consumo excessivo de carne atinge a estrutura do consumo mundial, o processo político-econômico-ecológico de produção de carne. Tal consumo é obviamente umbilical com a produção de mercadorias promovida pelo grande Sistema Inter-Estatal da atualidade.15 organizado além das fronteiras e por isso conferido de proteções diante de ameaças locais, o capital em sua encarnação desencarnada, e cuja mola-mestra é a acumulação ilimitada do capital.
Ainda em vista do exame da história, e em convergências com os aspectos da luta que entrega as questões de interseccionalidade para o debate, é importante observar que o atual modelo do sul estadunidense de pecuária, é herança de seu histórico de economia racializada desde a escravização negra, e mantido na atualidade por subcontratação e trabalho superexplorado e precário, executado principalmente por imigrantes, pessoas negras e mulheres. A indústria aviária estadunidense, por exemplo, usa de ameaças de deportação a imigrantes para forçar sua adesão às condições de trabalho, e até recorre ao trabalho de indivíduos no sistema prisional.12
Para Dickstein e colaboradores,12 a relutância dos setores de esquerda em endereçar a questão animal significa uma recusa em lidar com o especismo fundamental de instituições, relações e hábitos atuais, e deve ser adotado estrategicamente por quem está envolvido em outras lutas antropocêntricas. Os autores reiteram seu entendimento de especismo na linha de Cary Wolfe12 (acadêmico estadunidense de estudos animais, teoria crítica e teoria cultural) diferente da definição de Singer e Ryder, que comparam especismo com racismo e sexismo, e por isso tem sofrido críticas mais recentes.
Wolfe12 entende que especismo é a instituição de aceitabilidade social da morte animal sistemática e não criminalizada, baseada exclusivamente em sua espécie. Por consequência, o especismo é ancorado em uma base material e institucional, e não corre paralelo ao racismo e sexismo, mas opera conjuntamente à arranjos sociais que distribuem de maneira não uniforme precariedade e mortalidade entre populações marginalizadas, argumentam os autores estadunidenses.
Há conexão com as reflexões de Holloway9 acerca da forma estado, já que sua institucionalidade assegura a forma material de sobrevivência dos interesses capitalistas, já que a expansão do capital implica em seu aprofundamento cada vez maior em cada aspecto das nossas vidas, alcançado em parte pelo estado.9
A questão mais complexa de ser feita objetivamente talvez seja sobre a dificuldade em abandonar o consumo da alimentação de origem animal. Sua presença na humanidade, simbolismo, praticidade nutricional, aspectos culturais é impossível de ignorar. A antropologia estuda o quanto o alimento é importante para os agrupamentos humanos, em termos de unificação e identidade.
Fischler,24 antropólogo francês, pelo conceito de “Incorporação”, demonstra o quanto consumir determinados alimentos identificam um grupo. Ou seja, você é o que você come, mas também com quem come. E esse o que determina com quem. Trata-se de um aspecto de suma importância para a discussão, no entanto ultrapassa os limites dos objetivos aqui postos, e demanda a elaboração de análises integralmente dedicadas à questão.
O que pode ser afirmado de forma preliminar, é que certamente a alimentação comporta dimensões que dificulta sua mudança. Citado por Dickstein e colaboradores, Wadiwel,12 acadêmico australiano de Estudos Críticos Animais e professor de Direitos Humanos na Universidade de Sydney, postula que abandonar produtos de origem animal é sentido em uma perspectiva tradicional como a perda do mundo. Os autores recordam, todavia, que as lógicas e sentido por detrás do consumo não permanecem estáticas, pois essas condições sociais são instáveis por depender das normas sociais e sua influência em seu comportamento nos indivíduos, que podem mudar dramaticamente, como a aceitação social do hábito do tabagismo.
Assim, é importante estabelecer que aspectos aparentemente tão arraigados talvez não sejam naturais, mas naturalizados. Não diferente dos enunciados liberais sobre sua forma de organização da sociedade. Marx analisava a realidade com o intuito de enfraquecer a solidez aparente das categorias burguesas, e em decorrência mostrar que não são dadas pela natureza, mas demonstrá-las por formas historicamente específicas e transitórias de relações sociais, como o dinheiro, que não é uma coisa, nem um fenômeno natural, e sim uma forma historicamente determinada específica para sociedades configuradas pela produção de mercadorias.9
Como abordado, da mesma maneira que a abordagem marxista prima por não reproduzir o isolamento positivista das divisões liberais, e seu entendimento setorizado, não se pode aceitar o uso animal especista como destacável do capitalismo, e vice-versa. Junto disso, a exasperação diante da exploração capitalista evoca a dimensão ética e filosófica da revolução; como encontrado na colocação feita em um evento na Universidade da Califórnia em Berkeley em 2012 (27th Empowering Women of Color Conference) por Angela Davis,25 famosa militante marxista estadunidense, que aborda o próprio veganismo sob uma perspectiva revolucionária e ética:
Eu normalmente não menciono que sou vegana, mas isso mudou… Eu acho que é o momento certo para falar sobre isso [o veganismo] porque é parte de uma perspectiva revolucionária - como podemos não só descobrir relações de maior compaixão com seres humanos mas como podemos desenvolver relações de compaixão com outras criaturas com as quais dividimos esse planeta e isso significa desafiar toda forma industrial de produção de comida capitalista. [...] Muitas pessoas não pensam sobre o fato de que estão comendo animais, Quando comem um bife ou frango, muitas pessoas não pensam sobre o sofrimento tremendo que esses animais suportam simplesmente para tornarem-se produtos alimentícios para serem consumidos por seres humanos. Eu penso que a falta de engajamento crítico com a comida que comemos demonstra a extensão a qual a forma mercadoria tornou-se a maneira primária a que percebemos o mundo. Não vamos além daquilo que Marx chamou o valor de troca do objeto real - nós não pensamos sobre as relações que o objeto incorpora - e que foram importantes para a produção daquele objeto, seja nossa comida, ou nossas roupas ou nossos I-pads ou todos os materiais que usamos para adquirir uma educação em uma instituição como essa. Seria realmente revolucionário desenvolver um hábito de imaginar as relações humanas e não-humanas por detrás de todos os objetos que constituem nosso ambiente.25[sem paginação]
A falta de reconhecimento que a carne é um animal, resultado da alienação já discutida, é um dos pontos muito abordados por veganos no sentido da interferência e impacto em suas vidas na pesquisa de Vilela, pois existiu no início da prática, e em algum grau ainda persiste, dificuldade para entender, por exemplo, o que cada elemento na lista de ingredientes dos alimentos industrializados significa. Gelatina, corante cochonilha, dentre outros, tem sua origem animal repentinamente descoberta, inicialmente ocultada pela fragmentação que constitui a produção de mercadorias.
O desconhecimento e assombro acerca desses ingredientes são usados inclusive para o convencimento de outras pessoas, pelo choque em descobrir o quanto os animais são usados e estão em toda parte da produção.21 Na mesma pesquisa, outro aspecto citado pelos participantes é da estratégia do exemplo, que confirma a afirmação de Dickstein e colaboradores de que o veganismo age como forma de propaganda através de ação.12 Por sua própria existência e da exposição e oferta de sua comida, os participantes demonstram que, apesar da onipresença cotidiana do uso animal, é possível ser vegano.
Uma das questões principais da crítica de Holloway9 à forma estado capitalista, principalmente na sua já discutida forma jurídica, é o quanto o seu movimento produz uma individualidade abstrata, sem traços dos sujeitos em suas peculiaridades e verdadeiras individualidades.9 Consciente do quanto a desindividualização está em todo lugar, não admira percebê-la na produção de alimentos de origem animal, cujo processo de abate até o empacotamento retira toda a individualidade dos abatidos: rabos, chifres e genitálias14 até sua redução a torsos e pedaços, que dificulta a inclusive a constatação à qual espécie pertencem.
Após a exposição feita até o momento, é importante encaminhar para a mudança possível e o quanto o veganismo não só está relacionado mas pode ser decisivo para um projeto contra o capital. Casillas10 por colocar a revolução possível ao transferir o pensamento do exercício de poder para as relações de poder, com base em Foucault aponta a reconstrução das relações de força e poder com maior precisão, já que trata-se de reconstruir uma articulação entre resistência e dominação. Essa articulação é entre poder e estratégias, em uma ideia de política ampliada e que resgata relações antes excluídas. O autor evoca o sociólogo chileno Zemelman,10 ao declarar que a possibilidade de ação política só é factível quando pode ser constituída e não está pré-determinada.
Ao sair de tal determinismo, em alusão ao caminho que o debate percorreu até aqui, o veganismo empodera o movimento contra o capital ao borrar suas divisões hierárquicas impostas.14 A erosão das relações de exploração deve ocorrer imediatamente sob o capitalismo, pois se outro mundo é possível, ele nascerá desse; seu parto pode ser a partir da introdução de iniciativas vigorosas de atividades econômicas não capitalistas emancipatórias dentro do ecossistema capitalista.12
O reconhecimento de começar a ação dentro da situação atual e do choque sistêmico pela afronta à sua forma de produção, é correspondente ao momento de reorganização reconhecido como oportuno por Holloway.9 O irlandês afirma que o já mencionado processo de individualização é o primeiro e básico momento de forma estado, organizado de tal modo que no cotidiano da classe trabalhadora as questões importantes não são colocadas – uma delas, argumenta-se aqui, é o antropocentrismo e seu consequente especismo. Em retorno ao postulado do autor, a reestruturação da constituição política faz parte da crise e reestruturação do capital, que é muito importante enquanto oportunidade para a estratégia socialista e sua ação. Logo, as tentativas de reorganização das populações em novos grupos de interesse é que colocam a organização política, e por conseguinte novos problemas e oportunidades.9 Como afirma Galvão,19 é importante perceber as dimensões das lutas, que não podem ser vistas como estanques.
Existe risco, já que muitos movimentos buscaram mais a evasão das formas burguesas do que abolir seus processos de constituição e reconstituição,9 pois da mesma forma que autores consideram os movimentos sociais como expressão de lutas de classes, ao mesmo tempo lutar pela transformação do sistema socioeconômico não significa que seja revolucionário, pois depende de suas dimensões políticas.19
No veganismo, as dimensões são expressadas em sua essência política pela solidariedade com os explorados (dos animais até os trabalhadores de abate) em todos os ecossistemas humanos e não-humanos, idem ao projeto político que luta contra a depredação do capital.12 Reitera-se Casillas,10 em repetir que a primazia do político é o nexo entre história e sujeito, e são os sujeitos que geram projetos e estratégias de intervenção.
O boicote do veganismo é uma intervenção, cujo impacto pode ser reconhecido no próprio esforço que obriga o capital a dialogar com o VL, já que o capitalismo apenas defensivamente incorpora o consumo consciente para proteger-se de críticas, e ao fazê-lo mostra que precisa sustentar lógicas repressivas que localizam todos os demais consumidores não conscientes como desviados. O que gera uma contradição do capital, pois em um capitalismo ideal, quaisquer preocupações políticas de consumo são minimizadas para manter a ilusão de consumismo enquanto um paraíso.12
Sua reorganização é forçada por elas, pois a regra vigente é que animais, como os trabalhadores, sejam tratados como máquinas sem consideração pelo seu bem estar, apenas considerado quando impacta na qualidade da produção de suas mercadorias.14 Assim, da mesma forma que não é a boa vontade do sistema de produção de mercadorias burguês que produz itens veganos, também não é a democracia burguesa que limita o poder do estado, e sim a força da classe trabalhadora, salienta Holloway.9
Da crítica de Casillas10 pela reestruturação teórica marxista vem a afirmação da necessidade de reconhecer as possibilidades reais para os sujeitos sociais agirem,10 e o ataque não só a produção mas a organização do capital que caracteriza o veganismo pode ser visto como uma delas. O potencial transformador dos movimentos está ligado ao seu objetivo e forma de ação, se sistêmico ou anti-sistêmico, pró-ordem ou contraordem, levar e principalmente seu projeto político e ideologia.19
O veganismo dissecado em suas potencialidades, e desnudado em sua essência de libertação total, supera a tensão do questionamento se é ação individualizada coletiva ou protesto personalizado,20 e dentro do projeto político crítico que afirma o ataque ao capitalismo como central à libertação total dos seres sencientes, converge com a revolução marxista contra o capital e a emancipação da classe trabalhadora.
O veganismo, a despeito de associações com posições liberais de negociação com o modo de produção do estado capitalista, assume uma perspectiva revolucionária diante do entendimento de sua causa essencial – a libertação – como para todos os seres sencientes, o que é cristalizado em sua vertente anticapitalista, o VP. O aporte teórico crítico pode trazer contribuições para sua reflexão junto de um projeto de ação mais estruturado e organizado, que sofre ainda da dispersão de uma parte de seus indivíduos, muitos deles unidos entre si somente pelo boicote em comum.
Tal desagregação, contudo, já mostra mudanças com o surgimento de organizações como a União Vegana de Ativismo – UVA, uma rede que conecta coletivos antiespescistas e anticapitalistas nacionais. O ensaio teve o objetivo de fazer um exame inicial da situação, e de forma alguma pretende ser definitivo ou esgotar a discussão. A convergência achada está aberta para debate, e também que a investigação empreendida seja continuada e aprofundada. O desejo é que novas vozes ligadas à vertente popular ganhem eloquência e visibilidade acadêmica, necessárias para demonstrar a existência e ação política de pessoas veganas periféricas, tão acostumadas que estão com a invisibilidade - já que vem das periferias da periferia do mundo.
O autor J. F. Oliveira planejou o tema, pesquisou a literatura, realizou a análise, interpretação dos dados e revisão.
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