Crit Revolucionária, 2024;4:e008
Artigo original
https://doi.org/10.14295/2764-4979-RC_CR.2024.v4.27
i Universidade Federal de São Paulo – Unifesp, Escola Paulista de Medicina – EPM, Departamento de Farmacologia. São Paulo, SP, Brasil.
Autor de correspondência: Telma Florio telma.florio@unifesp.br
Recebido: 17 jul 2022
Revisado: 29 ago 2023
Aprovado: 22 jun 2024
https://doi.org/10.14295/2764-49792RC_CR.v4.27
Financiamento: CAPES
Copyright: Artigo de acesso aberto, sob os termos da Licença Creative Commons (CC BY-NC), que permite copiar e redistribuir, remixar, transformar e criar a partir do trabalho, desde que sem fins comerciais. Obrigatória a atribuição do devido crédito.
Este artigo explora o potencial da Cannabis como ferramenta de transformação social e ambiental, propondo a criação de um Centro de Pesquisa em Saúde Planetária. Aborda o histórico do uso da Cannabis, o sistema endocanabinóide e os benefícios de sua regulação por meio de práticas integrativas e complementares em saúde. O projeto social da Associação de Mulheres Esportistas Ativistas (AMEA) é apresentado como modelo de intervenção social, destacando a importância da educação e capacitação de mulheres em situação de vulnerabilidade. O artigo defende a criação do Centro de Pesquisa como um hub para pesquisa científica, intercâmbio de conhecimentos e desenvolvimento de políticas públicas relacionadas à Cannabis, com potencial para atrair financiamento e gerar oportunidades de pesquisa em diversas áreas, além de promover a saúde planetária.
Descritores: Cannabis sativa; Políticas públicas; Educação; Reparação social; Saúde planetária.
LA PROHIBICIóN QUE ENCARCELA LA SALUDResumen: Este artículo explora el potencial del Cannabis como herramienta de transformación social y ambiental, proponiendo la creación de un Centro de Investigación en Salud Planetaria. Aborda la historia del uso del Cannabis, el sistema endocannabinoide y los beneficios de su regulación a través de prácticas integrativas y complementarias de salud. El proyecto social de la Asociación de Mujeres Deportistas Activistas (AMEA) se presenta como modelo de intervención social, destacando la importancia de la educación y la capacitación de mujeres en situación de vulnerabilidad. El artículo defiende la creación del Centro de Investigación como un espacio para la investigación científica, el intercambio de conocimientos y el desarrollo de políticas públicas relacionadas con el Cannabis, con potencial para atraer financiación, generar oportunidades de investigación y promover la salud planetária. Descriptores: Cannabis sativa; Política pública; Educación; Reparación social; Sostenibilidad. |
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THE PROHIBITION THAT KEEPS HEALTH IMPRISONEAbstract: This article explores the potential of Cannabis as a tool for social and environmental transformation, proposing the creation of a Research Center for Planetary Health. It addresses the history of Cannabis use, the endocannabinoid system, and the benefits of its regulation through integrative and complementary health practices. The social project of the Association of Activist Sportswomen (AMEA) is presented as a model of social intervention, highlighting the importance of education and empowerment of women in vulnerable situations. The article advocates for the creation of the Research Center as a hub for scientific research, knowledge exchange, and development of public policies related to Cannabis, with the potential to attract funding, generate research opportunities, and promote planetary health. Descriptors: Cannabis sativa; Public policy; Education; Social repair; Sustainability. |
A Cannabis é uma planta de uso milenar e, em termos históricos, suas propriedades medicinais já eram descritas há muitos anos. No entanto, sua prescrição como uso terapêutico sucedeu-se há bem pouco tempo. Apesar dos avanços nas pesquisas científicas em vários países e os diversos relatos clínicos de pacientes tratados com medicamentos à base da planta, há um enorme preconceito que precisa ser desmistificado. Hoje, com a facilidade de divulgar informações, é de extrema importância transmitir os avanços científicos de forma didática para a sociedade. O Brasil inaugurou o primeiro museu dedicado a propagar a história da Cannabis e sua contribuição terapêutica. A criação do museu é uma iniciativa da Organização Não Governamental “Abrace Esperança”, no Parque Solon de Lucena, no Centro de João Pessoa, Paraíba. Além de contar a história do uso medicinal da planta, o museu tem o intuito de apoiar as pesquisas e contextualizar as legislações. Neste local são expostos frascos medicinais antigos fornecidos em farmácias, jornais, revistas e capas de filmes antigos sobre o tema, além de depoimentos de pessoas que ajudaram no progresso científico. Ainda, há relatos de mães mostrando como a planta mudou a vida de seus filhos e sua luta diária por apoio governamental.1
O movimento pela Cannabis medicinal no Brasil teve início há cerca de uma década, impulsionado principalmente por mães e familiares de pacientes, que se organizaram em associações sem fins lucrativos. Essas associações desempenharam um papel crucial na promoção do debate sobre o uso terapêutico da Cannabis no país, muitas vezes operando em uma área legal cinzenta. Atualmente, existem mais de 30 associações de pacientes de Cannabis medicinal no Brasil, distribuídas em 14 estados e no Distrito Federal. Essas organizações variam em seus objetivos e atividades, desde o cultivo e produção de medicamentos à base de Cannabis até a oferta de suporte jurídico e orientação médica para pacientes. Diante da lacuna deixada pelo poder público, essas entidades têm se multiplicado pelo país, oferecendo uma variedade de serviços aos pacientes. Recentemente, foi iniciado um estudo inédito pela Plataforma Brasileira de Política de Drogas (PBPD) para mapear e analisar essas associações, visando compreender melhor seu papel no cenário da Cannabis medicinal no Brasil e subsidiar políticas públicas mais efetivas nessa área.2
Existem também associações que oferecem encaminhamento médico ou orientação jurídica para que o paciente possa buscar o acesso à medicação através do SUS ou de planos de saúde. Com a omissão do poder público, essas entidades se multiplicam pelo país, estando presente hoje em quatro regiões brasileiras. Algumas delas se reuniram recentemente com objetivo de criar uma federação que represente os interesses dos pacientes no âmbito político e jurídico nacional.3
Assim, o objetivo desse artigo é explorar o potencial da Cannabis como ferramenta de transformação social e ambiental, propondo a criação de um Centro de Pesquisa em Saúde Planetária. Para isso irá se refletir sobre os caminhos históricos do uso da Cannabis em conjunto com o sistema endocanabinóide e os benefícios de sua regulação por meio de práticas integrativas e complementares em saúde. Ainda, irei explorar a possibilidade do projeto social da Associação de Mulheres Esportistas Ativistas (AMEA) como potencial incentivo do uso da Cannabis e a defesa da criação do Centro de Pesquisa como um hub para pesquisa científica, intercâmbio de conhecimentos e desenvolvimento de políticas públicas relacionadas à Cannabis.
A Cannabis tem sido um tema controverso na política há décadas. Apesar de seu potencial para uso médico e da tendência crescente de legalização, muitos políticos continuam firmemente contrários a qualquer forma de legalização da Cannabis. Um dos principais argumentos contra a legalização da Cannabis é a crença de que é uma droga de entrada que leva ao uso de drogas mais pesadas. No entanto, esse argumento foi desmascarado por numerosos estudos, que mostraram que a maioria das pessoas que usam Cannabis não passa a usar drogas mais pesadas. Outro argumento contra a legalização da Cannabis é a crença de que isso levará ao aumento do crime e da desordem social. No entanto, este argumento também não é suportado por evidências. De fato, estudos mostraram que em lugares onde a maconha foi legalizada, não houve aumento do crime ou desordem social. Apesar das evidências a favor da legalização da maconha, muitos políticos continuam se opondo a ela. Isso pode ser devido a uma variedade de fatores, incluindo crenças pessoais, pressão de grupos de interesses especiais ou falta de compreensão do assunto. É importante que os políticos examinem criticamente as evidências e tomem decisões informadas sobre a política de Cannabis. Ao fazer isso, eles podem ajudar a criar uma abordagem mais justa e eficaz para a regulamentação da Cannabis.4
O uso da Cannabis como tratamento de saúde vem sendo utilizado desde os primórdios da medicina. Nas culturas antigas mais avançadas como a chinesa, egípcia e indiana, a Cannabis sempre esteve relacionada à cura e ao bem-estar. Dos textos médicos milenares, até Deuses como o hindu Shiva e a egípcia Sechat, a planta sempre foi utilizada para a medicina e até para o uso social.3
Em 1964, o Dr. Raphael Mechoulam5 descobriu o THC, que foi o primeiro fitocanabinóide identificado. Este trabalho inovador abriu caminho para a descoberta do sistema canabinóide endógeno dos quais anandamida e 2-arachidonoylglicerol são considerados os principais canabinóides endógenos em mamíferos, incluindo humanos. Tanto a anandamida quanto o 2-arachidonoylglicerol regulam a sensibilidade da serotonina, dopamina, ácido gama-aminobutírico (GABA), acetilcolina e glutamato no sistema nervoso central (SNC), demonstrando assim como esses canabinóides endógenos regulam muitos processos fisiológicos e patológicos como dor, resposta imune, apetite, termorregulação, energia, metabolismo, depressão e fertilidade e também desempenham um papel na proteção do cérebro contra danos causados por lesões ou doenças, ajuda a reduzir a inflamação e a prevenir a morte de células cerebrais em condições de estresse; finalmente, está envolvido em processos de neurogênese, plasticidade sináptica, aprendizado motor e controle de metabolismo de insulina. Dada sua extensa variedade de funções e ações no organismo, disfunções no Sistema Endocanabinoide (SEC) têm sido associadas a várias doenças e distúrbios, incluindo obesidade, diabetes, epilepsia, esquizofrenia, ansiedade e muitas outras. Como resultado, esse sistema tem sido um alvo importante para o desenvolvimento de novas terapias farmacológicas. O SEC é composto por dois tipos principais de receptores: CB1 e CB2, que são ativados por endocanabinoides (ECs), que são lipídios produzidos pelo próprio organismo, ou por fitocanabinoides (FCs), que são compostos derivados da planta Cannabis sativa, embora esse sistema complexo venha sendo descrito há cerca de 40 anos, pesquisas mostram que ele pode ser uma via terapêutica promissora para o tratamento de diversas condições médicas, como dor crônica, ansiedade, distúrbios do sono e epilepsia.6
A terapia canabinoide faz parte de uma abordagem integrativa e a combinação dos canabinoides com outras formas de ativação do sistema endocanabinoide contribui para melhores resultados terapêuticos e melhor qualidade de vida.
De acordo com um estudo de 2022 publicado no portal Mary Ann Libert, certas práticas não medicamentosas, em particular os exercícios físicos, podem aumentar a atuação do SEC, que é o responsável pelo controle do bem-estar do nosso organismo, incluindo a regulação do metabolismo e as respostas ao estresse. Seguindo a linha do estudo citado, a “Systematic Review and Meta-Analysis on the Effects of Exercise on the Endocannabinoid System”, após a prática de atividades físicas, os níveis de canabinóides sintetizados pelo nosso organismo aumentou significativamente.5
Isso nos mostra que existe uma íntima relação entre a prática de exercícios e a regulação do nosso sistema endocanabinoide, e logo com a regulação do nosso organismo também. Além disso, podemos afirmar que o SEC é capaz de contribuir com os efeitos benéficos sentidos após a atividade, incluindo reduções na dor e ansiedade e melhorias no funcionamento cognitivo e no humor. Portanto, o exercício físico pode atuar como um tratamento, que não utiliza medicamento, promissor para uma variedade de distúrbios relacionados ao estresse que podem se beneficiar da atuação do nosso sistema endocanabinoide.5
Segundo Maciel et al.,7 o SEC é um sistema dinâmico e adaptativo, que pode ser modulado por diversos fatores ambientais, genéticos e epigenéticos. Entre esses fatores, destacam-se as práticas de comportamento, que são hábitos ou atividades que podem influenciar positiva ou negativamente a atividade ou a expressão do SEC. Algumas das principais práticas de comportamento que podem estimular o SEC são:
- Exercício físico: o exercício físico é capaz de aumentar os níveis de endocanabinoides (ECs) no cérebro e no corpo, especialmente o anandamida (AEA), que é responsável pelo chamado "barato do corredor", uma sensação de bem-estar e euforia após a atividade física. O exercício físico também pode aumentar a expressão dos receptores CB1 e CB2 em diversos tecidos, potencializando os efeitos dos ECs. Além disso, o exercício físico pode interagir com outros sistemas que modulam o SEC, como os opioides, a serotonina e a dopamina. O exercício físico pode ter benefícios para diversas condições clínicas associadas ao desequilíbrio ou à disfunção do SEC, como as doenças neurodegenerativas, as doenças inflamatórias, as doenças psiquiátricas, as doenças metabólicas e as doenças dolorosas.
- Meditação: a meditação é uma prática milenar que consiste em focar a atenção no presente, na respiração ou em um mantra, com o objetivo de acalmar a mente e o corpo. A meditação pode aumentar os níveis de ECs no cérebro e no corpo, especialmente o 2-AG (2-arachidonoylglycerol), que é responsável pela sensação de relaxamento e tranquilidade após a meditação. A meditação também pode aumentar a expressão dos receptores CB1 e CB2 em diversos tecidos, potencializando os efeitos dos ECs. Além disso, a meditação pode interagir com outros sistemas que modulam o SEC, como os opioides, a serotonina e a acetilcolina. A meditação pode ter benefícios para diversas condições clínicas associadas ao desequilíbrio ou à disfunção do SEC, como as doenças psiquiátricas, as doenças inflamatórias, as doenças autoimunes e as doenças oncológicas.
- Alimentação: a alimentação é um fator crucial para a saúde e o equilíbrio do SEC, pois fornece os substratos necessários para a síntese dos ECs e pode conter fitocanabinoides (FCs) ou outros compostos que podem interagir com o SEC. A alimentação ideal para estimular o SEC deve ser rica em ácidos graxos essenciais (ômega-3 e ômega-6), que são os precursores dos ECs; em alimentos vegetais (frutas, verduras, legumes), que podem conter FCs ou outros fitoquímicos que podem modular o SEC; em alimentos fermentados (iogurte, kefir), que podem conter probióticos que podem influenciar o SEC por meio do eixo intestino-cérebro; e em alimentos orgânicos, que evitam o consumo de agrotóxicos que podem interferir no SEC. A alimentação inadequada e rica em alimentos processados, refinados, fritos, açucarados, gordurosos e artificiais, podem causar inflamação, estresse oxidativo, disbiose intestinal e resistência à insulina, que prejudicar o SEC.
- Sono: o sono é um processo fisiológico essencial para a restauração e a consolidação da memória, do aprendizado, da imunidade e da homeostase do organismo. O sono é regulado por um ciclo circadiano, que é sincronizado pela luz e pela escuridão. O SEC é um dos principais sistemas que participam da regulação do sono, pois os ECs e os FCs podem afetar a qualidade e a quantidade do sono. Os ECs e os FCs podem induzir o sono por meio da ativação dos receptores CB1 no cérebro, que inibem a liberação de neurotransmissores excitatórios, como a glutamato e a acetilcolina. Os ECs e os FCs também podem influenciar as fases do sono, pois eles podem aumentar o sono de ondas lentas (SOL), que é a fase mais profunda e restauradora do sono; e diminuir o sono REM (do inglês rapid eye movement), que é a fase mais superficial e associada aos sonhos. Além disso, o SEC também pode ser afetado pelo sono, pois os níveis de ECs e a expressão dos receptores CB1 variam ao longo do ciclo circadiano, sendo mais altos à noite e mais baixos pela manhã. O sono adequado para estimular o SEC deve ter uma duração média de sete a nove horas por noite, com uma regularidade de horários para dormir e acordar, com uma exposição adequada à luz natural durante o dia e à escuridão durante a noite, com uma temperatura ambiente confortável e com uma ausência de ruídos ou distrações.
Estudos de mundo real têm sido considerados uma ferramenta para complementar informações de ensaios clínicos em contextos em que estes são restritos, como em generalizações para populações mais amplas e heterogêneas, avaliações de longo prazo, doenças e eventos adversos raros. Pretendemos inovar, através de interfaces com projetos sociais, desenvolvendo impacto medicinal, social, educacional e ambiental a partir de recursos gerados com a plataforma comercial na coleta Dados de Mundo Real – DMR para gerar Evidências de Mundo Real – EMR no contexto medicinal, social e ambiental para promoção da saúde humana, animal e ambiental através da planta Cannabis.6
Através do projeto social pela Associação de Mulheres Esportistas Ativistas – AMEA, propomos a prática da economia circular e do consumo sustentável, contribuindo com ações educativas, esportistas, nutricionais, práticas integrativas e complementares em saúde (PICS) e conservação ambiental, fomentando a saúde em uma perspectiva mais ampla, unindo os projetos como modelo em novos programas educacionais para promoção de políticas públicas efetivas. Desenvolver um questionário para validação da promoção da qualidade de vida.
A AMEA propõe Esportes em meio a natureza, como ferramenta de educação socioambiental através do projeto Natureza Caiçara e pretende desenvolver um Centro de Pesquisa em Saúde Planetária, fomentando as Práticas Integrativas e Complementares em Saúde e Educação Ambiental, tendo a Cannabis como ferramenta de transformação, oferecendo melhores condições de trabalho, capacitando mulheres na promoção da qualidade de vida e sustentabilidade ambiental contribuindo com evidencias de mundo real. Na medida que as mulheres de baixa renda lutam para formar uma família e criar os filhos, elas tendem a reproduzir certo estilo de vida que, juntamente com as condições precárias, acaba afetando a saúde e a melhor integração de seus membros. Essas famílias, particularmente as mulheres, suportam uma carga desproporcional ao procurar administrar o consumo e a produção do lar em condições de crescente escassez. A monotonia da rotina doméstica, aliada à falta de perspectiva de mudança, traz frustrações para a mulher, pois ela se vê obrigada, seja por ter filhos pequenos, seja por determinação do companheiro, a restringir-se à vida doméstica, quando também desejaria para si outros horizontes de realização pessoal. A falta de lazer e outras formas de entretenimento contribuem para maior risco de desestruturação familiar.
As mulheres sofrem de vários transtornos físicos, mentais, comportamentais e sociais, principalmente a população de baixa renda, caracterizado por dificuldades financeiras, precárias condições de moradia, agravado por uma rotina doméstica cansativa, falta de lazer e autonomia pessoal restrita, necessitando de novas oportunidades para aumentar o bem-estar por meio de adoção de políticas de promoção de saúde mais efetivas. O esporte é uma atividade abrangente, visto que engloba diversas áreas importantes para a humanidade, como saúde, educação, turismo, entre outros. É importante destacar também o papel social que o esporte desempenha no desenvolvimento integral dos sujeitos. É sabido que o esporte é uma forma de sociabilização e de transmissão de valores. Portanto, observa-se que o esporte possui amplas repercussões, sendo um fenômeno que possui uma linguagem universal. Os esportes em ambientes naturais, abrem oportunidades para o desenvolvimento humano, conservação ambiental e inclusão social, agregando o coletivo e comunidade nas habilidades do futuro com a prática e ações educadoras em saúde e sustentabilidade.
A legalização da Cannabis pode impulsionar o crescimento econômico ao criar empregos no setor e gerar receita tributária, melhorar o acesso ao medicamento para pacientes que a utilizam para fins médicos, além de torná-la mais acessível e rastreável, contribuir com a redução de danos em dependentes químicos, podendo ajudar a diminuir as taxas de overdoses relacionadas a opioides e drogas sintéticas. Muitos benefícios ambientais, podendo trazer contribuições significativas para o meio ambiente, pois permite práticas de cultivo mais ecológicas e produtos sustentáveis.8
O proibicionismo começa no início do século XX e é pautado em argumentos xenofóbicos e racistas. A mídia sempre teve um papel fundamental para reforçar alguns estigmas e validar o proibicionismo. Desde então, essa política serve como mecanismo de controle social. A própria guerra às drogas funciona como um aparato de controle social, político e industrial.9
A luta contra o racismo e a luta pela transformação social para a construção de uma sociedade melhor passa necessariamente pela luta contra o racismo na sua dimensão estrutural sendo necessário renunciar a privilégios para ser efetivo, assim como o machismo, pela condição privilegiada estruturalmente nas relações sociais, políticas e econômicas, percebemos claramente, como o racismo é fundamental para todas as formas de exploração econômica.10
Na população carcerária a maioria está presa por tráfico de drogas e isso seria uma maneira clara de desafogar esse sistema torturador que a gente tem no Brasil. A única pessoa que não consegue maconha hoje em dia no Brasil é quem precisa dela, para fins medicinais.11
A burocracia para conseguir a Cannabis medicinal no Brasil ainda é complicada e os valores são altos, mas isso já é possível e cada vez mais surgem associações com o objetivo de tornar o acesso da Cannabis medicinal mais democrático. A Associação Brasileira de Pacientes de Cannabis Medicinal – AMA+ME, a Canapse e a Sociedade Brasileira de Estudos Cannabis – SBEC são exemplos de associações importantes para o ativismo brasileiro. Visam a questão científica da cannabis. Outras associações como a Abrace e a Associação de Apoio à Pesquisa e a Pacientes de Cannabis Medicinal – APEPI têm permissão para cultivar Cannabis medicinal. O objetivo geral dos coletivos é produzir e lutar pelo acesso da maconha medicinal, com o controle de qualidade adequado e baixo custo. O tratamento de algumas doenças com a cannabis medicinal mudou a vida de algumas famílias no Brasil. As fundadoras da APEPI são mulheres e mães, que enfrentaram o desafio diário de controlar as crises e convulsões dos seus filhos com remédios convencionais. Atualmente, essas mães tratam seus filhos com óleo dos canabinoides extraídos da cannabis e observam um resultado muito melhor no tratamento das convulsões e também na qualidade de vida dos filhos. Com o passar dos anos a luta por uma política de drogas mais justa no Brasil ganhou várias batalhas. O direito de se manifestar foi o pontapé inicial, mas a possibilidade de usar a cannabis como medicina para diferentes doenças e sintomas é a maior conquista da década. A caminhada por leis mais justas ainda é longa.9
A Canapse pesquisa, também, outras substâncias psicotrópicas controladas que podem apresentar potencial terapêutico. Psilocibina, DMT, LSD e outros compostos naturais de interesse científico, assim como a Cannabis, sofrem com a barreira jurídica, política, burocrática e moralista.11
O proibicionismo afasta a ciência e a medicina dos usos terapêuticos das drogas ilícitas, pune a sociedade, alimenta uma guerra, na qual só os mais fracos morrem e não acaba com a existência das drogas, muito menos com o seu uso problemático. A política de Redução de Danos traz uma perspectiva e uma possibilidade de lidar com as drogas e seus usuários de uma forma diferente, com um olhar mais humano. O uso problemático de drogas deve ser cuidado e compreendido como uma questão de saúde pública, não de segurança. As drogas vão existir e é necessário que haja uma regulamentação das substâncias para o uso medicinal, religioso e recreativo. O mercado regulamentado é vantajoso para todos os pilares. Os usuários têm acesso a uma substância mais segura e de mais qualidade, o paciente pode tratar suas enfermidades sem problema, de forma acessível e gratuita e o Estado pode faturar muito com impostos, além de conseguir controlar quem são os usuários e evitar que, principalmente, crianças e adolescentes façam o uso indevido de substâncias.9
O país ainda não conseguiu regulamentar coisas básicas como o direito ao cultivo em casa ou em associações e cooperativas, a disponibilidade de canabinoides para pesquisa, e continua agredindo a população por comercializar remédios. Então é preciso realmente legalizar, regulamentar o uso medicinal da maconha imediatamente porque a população sofre muito. Inclusive em relação à Covid, onde houve um aumento muito grande do consumo de maconha, não só aqui, mas em diferentes países do mundo, só que em um ambiente de proibição, então com muitos danos farmacológicos e sociais aos usuários. Isso precisa mudar.11
Milhões de brasileiros, com diferentes doenças, podem se beneficiar da Cannabis. As cadeias de medicamentos, fitoterápicos e produtos do cânhamo industrial abrem um leque de oportunidades e inovação nas linhas de produtos para humanos e animais, bem como de produtos industriais com perspectivas promissoras no mercado interno e mundial. A indústria manipula nossos legisladores, falsos moralistas, onde visam apenas o lucro e negam o acesso a população, a essa planta, visando um monopólio doentio dos compostos isolados desta planta, a um custo inacessível a grande maioria, sendo o cânhamo, um gênero da planta sem efeitos entorpecentes, não condizente com a fala proibicionista.
É chegada a hora de os profissionais de saúde entenderem, de uma vez por todas, que o objetivo final de seu trabalho é o bem-estar do coletivo, ter em mente que conhecimentos, e principalmente a troca amigável deles, obedecem a uma equação somatória e não de divisão de poder.12
As implicações comerciais e econômicas do mercado de Cannabis medicinal são enormes, assim como seu impacto terapêutico que até agora tem sido limitado por restrições em estudos clínicos. A história plurimilenar do uso medicinal da Cannabis nos ensina tudo o que devemos saber sobre seu potencial farmacológico e as patologias que se beneficiaram principalmente com sua aplicação. Precisamos de uma abordagem que não apenas colete dados estatísticos, mas que também respeite e incorpore as diversas formas de conhecimento sobre esta planta, reconhecendo seu papel não só na saúde individual, mas na saúde do planeta como um todo.13
O renascimento da Cannabis não é apenas sobre políticas permissivas ou oportunidades econômicas, mas sobre reconectar-nos com saberes antigos e formas mais naturais de cuidado. Assim, ao reavaliarmos nossa relação com a Cannabis, estamos também desafiando narrativas impostas e redescobrindo formas de cura que respeitam tanto o ser humano quanto a natureza. No entanto, é crucial que essa redescoberta seja guiada não apenas por interesses econômicos, mas por uma ética de cuidado com a Terra e todos os seres. Como Krenak14 adverte que enquanto a humanidade está se distanciando do seu lugar, um monte de corporações espertalhonas vai tomando conta da Terra. Portanto, qualquer regulamentação deve priorizar o bem-estar coletivo e a proteção dos mais vulneráveis, alinhando-se com uma visão de mundo que respeita e preserva a vida em todas as suas formas.
A proibição da Cannabis tem sido um entrave significativo para a saúde pública e o desenvolvimento socioeconômico.15 No entanto, com a implementação de políticas públicas informadas e a capacitação de profissionais, é possível transformar essa realidade. A educação e a sustentabilidade são pilares fundamentais para essa mudança, e iniciativas como as da AMEA são exemplos de como podemos avançar nesse caminho.
Para alcançar esse objetivo, propomos a formação de grupo interdisciplinar em pesquisa canábica cientifica na promoção da saúde planetária, focado na obtenção de evidencias no uso medicinal e industrial da Cannabis.16 Este grupo deve desenvolver novas metodologias em educação básica, profissional e científica sobre plantas de poder e seu potencial combinativo. A plataforma https://caonabico.com será utilizada para integrar pesquisa clínica virtual, conectar profissionais e pacientes, e gerar evidências de mundo real. Isso não só aumentará o potencial de participantes de estudos, mas também contribuirá significativamente para a melhoria da saúde planetária.17
O Relatório de desenvolvimento humano de 1990 já destacava a degradação ambiental como um dos obstáculos à melhoria da vida humana, sendo um desafio educacional para todos os países.18,19 Os principais fatores apontados foram os riscos à saúde, decorrentes da poluição industrial e dos desastres ambientais, além do desmatamento, da carência de acesso à água e a instalações sanitárias adequadas, da falta de tratamento de esgoto, da insegurança alimentar, do envenenamento por pesticidas e da poluição atmosférica. De acordo com a Organização Mundial da Saúde – OMS,20,21 o custo de medidas para remediar a degradação ambiental e eliminar os significativos riscos à saúde pública é superior ao custo de prevenção.
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